segunda-feira, 30 de maio de 2011

Catálogo reúne 450 filmes desde ditadura até democracia argentina

Organizações humanitárias argentinas apresentarão na próxima semana um catálogo de 450 filmes para a "reflexão e análise" da cinematografia desde os tempos da ditadura (1976-1983) até a democracia atual.

Entre outras "pérolas", o catálogo inclui um filme de propaganda só divulgado em quartéis enquanto paramilitares matavam e sequestravam ativistas políticos, disse à Agência Efe a pesquisadora Marcela Visconti, da ONG Memória Aberta, que coordenou a recopilação com seu colega Esteban Garelli.

Também se destaca um filme sueco que arranhou a imagem do regime em um festival de cinema em 1979, um ano após a Argentina sagrar-se campeã da Copa do Mundo em casa durante um período em que milhares de pessoas tinham desaparecido ou estavam em prisões clandestinas submetidas a torturas, apontou.

Sob a lógica da estreita censura e repressão política, a ditadura militar reduziu a cinematografia argentina a uma generalidade de temas banais, com elogios às forças de segurança e aos valores conservadores, comentou Marcela.

Toda a filmografia argentina de "denúncia" dos crimes da ditadura foi rodada no exílio, como é o caso de "Las AAA son las tres armas" (Perú, 1977), dirigida por Jorge Denti e que narra os vínculos do regime com o grupo de extrema-direita Aliança Anticomunista Argentina, a "Triplo A".

Os filmes estão catalogados por cronologia e ordem alfabética, assim como por cerca de 20 temas que vão desde "a favor do regime" até "filmes da transição democrática", passando pelas categorias "busca por verdade e justiça", "artistas, perseguição e censura" e "vitimados".

Marcela assinala que entre os filmes a favor do regime há vários cujos diretores se desconhecem por terem usado pseudônimos, enquanto outros tiveram coragem de desafiar a censura mediante referências "ocultas ou nem tanto".

Na pesquisa para criar o catálogo, foi "um grande achado" o filme "Estoy herido...ataque!" (1977), só divulgado nos quartéis, obra de "Federico Alegre", "cineasta" que dirigiu um grupo de atores desconhecidos para narrar um "heroico" combate com a guerrilha no norte da Argentina, indicou.

Como contrapartida, aparece o filme sueco "Murallas de la libertad" (Frihetens murar), de 1978, dirigido por Marianne Ahrne, que narra a vida de uma artista argentino no exílio e cuja existência era desconhecida no seu país de origem.

"Este filme foi projetado na abertura do 11º Festival Internacional de Cinema de Moscou, em 1979, e provocou um grande desgosto à delegação argentina, que o considerou ofensivo para o país e pressionou para que fosse retirado do festival. Nunca pôde ser visto na Argentina e agora faz parte do arquivo da Memória Ativa".

Entre os filmes com temas "tabu" que escaparam à censura, aparecem "Últimos días de la víctima", de 1980, sobre associações de um grupo parapolicial, e "Tiempo de revancha", de 1981, que narra um conflito sindical em uma mineradora multinacional, ambos dirigidos por Adolfo Aristarain e protagonizados por Federico Luppi.

Por meio de alegorias, com o filme "Los miedos" (1980), sobre uma epidemia que arrasa uma cidade, Alejandro Doria foi outro dos poucos cineastas argentinos que tentaram vencer a censura.

Com a restauração da democracia, no fim de 1983, houve o ressurgimento do cinema nacional, um dos mais pujantes da América Latina, e se multiplicaram os filmes sobre os crimes da ditadura e suas sequelas políticas e sociais, como relata "A história oficial", de Luis Puenzo, vencedora do Oscar de 1985.

O catálogo, que vai desde 1976 até este ano, será apresentado na próxima quinta-feira no Museu de Arte Latino-Americana de Buenos Aires pelas Mães da Praça de Maio, a Assembleia pelos Direitos Humanos e o Serviço de Justiça e Paz, organizações ligadas à Memória Ativa.

Fonte: EFE


Fonte: Portal Vermelho em 30.05.2011.

"You Don´t Know Me" por Caetano Veloso

domingo, 22 de maio de 2011

Filme: "Bróder" impressiona com retrato complexo da periferia

A câmara persegue desesperadamente três garotos que correm por entre as vielas e corredores estreitos do Capão Redondo. No entanto, aqui, eles não estão fugindo da polícia ou de traficantes. Trata-se de uma brincadeira, uma disputa para ver quem chega primeiro ao local combinado. É com essa visão lúdica da periferia que Jeferson De faz sua ótima estreia com Bróder. O longa se diferencia dos demais filmes de favela do cinema brasileiro.

Por Leonardo Vinicius Jorge

Após premiação da crítica no festival de Paulínia e de ganhar quase tudo em Gramado, a produção chegou ao circuito comercial neste 21 de abril e dá novo fôlego ao cinema nacional, fugindo um pouco do óbvio e dos temas batidos que foram se acumulando nos últimos anos.

Na história, três amigos de infância se reencontram depois de um período de distanciamento: Pibe (Sílvio Guindane) decidiu sair do Capão Redondo e se tornou corretor de imóveis, mas passa por problemas financeiros; Jaiminho (Jonathan Haagensen) virou jogador de futebol na Espanha e promessa de futuro craque da seleção brasileira; Macu (Caio Blat) continuou no bairro e está prestes a entrar no mundo do crime ao aceitar que sua casa seja o cativeiro de uma criança que será sequestrada.

Os três decidem aproveitar a festa de aniversário de Macu para reforçar a amizade e passar o dia juntos, passeando pelo bairro no qual cresceram. Mas a coisa complica quando os traficantes da área decidem aproveitar a passagem de Jaiminho para sequestrá-lo. É nessa hora que Macu precisará decidir qual atitude tomar: proteger o amigo ao custo de comprar uma dívida com os criminosos ou usar a situação como prova de sua coragem para entrar no grupo dos traficantes.

Capão Redondo em cena

Bróder é cheio de acertos, a começar pela escolha do Capão Redondo como locação. O bairro da Zona Sul da capital paulista não é apenas um ambiente para a história, mas um personagem do filme, além de servir como microuniverso do Brasil das contradições e das facetas multiculturais.

As situações mostram que Jeferson De tem muito mais dor de cabeça do que Spike Lee na hora de fazer críticas sociais e raciais. E a família de Macu mais uma vez mostra o homem da casa como um elemento fraco, simbolizando a ausência do Estado – uma metáfora frequente no cinema nacional.

Mas a interessante história (elaborada por Jeferson De em parceria com Newton Cannito), o olhar diferenciado e os belos planos e enquadramentos não seriam suficientes para sustentar o filme se não houvesse uma perfeita química entre os atores, e o elenco não decepciona.

Além da sempre competente Cássia Kiss, que interpreta a sofrida Dona Sônia, mãe de Macu, e Ailton Graça, no papel do padrasto inseguro e alcoólatra, Bróder funciona por conta de sua trinca de protagonistas.

Como o próprio diretor brinca, Bróder é sobre a família do Zé Pequeno (personagem do filme Cidade de Deus), é sobre como esses garotos se tornam “Zés Pequenos” diariamente. Aliás, há outro paralelo entre o filme de Jeferson De e de Fernando Meirelles: é em Bróder que conhecemos o verdadeiro “Trio Ternura”. Veja abaixo o trailer:



Fonte: Pipoca Moderna


Fonte: Site Portal Vermelho em 21.05.2011